O jornalista precisa de uma boa formação humanista, saber ver o mundo, afirma Lúcio Flávio Pinto

A formação do jornalista é o tema de hoje da entrevista dos leitores com o jornalista Lúcio Flávio Pinto. Veja o que ele respondeu à internauta Rose Silveira:

Rose Silveira – Você já teve a experiência de lecionar no curso de Comunicação Social (Jornalismo) da Universidade Federal do Pará. Mesmo considerando as variações nos perfis dos cursos de Jornalismo oferecidos pelas universidades brasileiras, a seu ver, o que não deveria faltar na formação do jornalista?

LFP – Uma boa formação humanista. Por isso, diversificada e profunda. Não me lembro de ter indicado um único manual para os meus alunos nem de fazê-los viajar pela teoria da comunicação (que, a meu ver, devia fazer parte do curso de Comunicação, se passasse a existir o de Jornalismo; caso contrário, devia receber abrigo sob o teto da semiótica e da linguística, ou mesmo da teoria literária).

Dei-lhes grandes textos do jornalismo próximo da literatura, da história ou da ciência política. E de textos da literatura que iluminam a abordagem jornalística. Ver o mundo, saber anotá-lo e repassá-lo de forma fluente, clara e agradável para os outros é a missão do jornalista.

Também mostrei aos meus alunos onde esse jornalismo foi praticado. Levava para a sala de aula exemplares das melhores publicações, nacionais e estrangeiras, do meu próprio acervo, para que eles as vissem e aprendessem a fazer algo próximo ou semelhante através de quem fizera o melhor. Por fim, testei-os a fazer com seus próprios recursos, segundo suas ideias pessoais. Foi o que fiz em sete anos na UFPA.

2 Comentários

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2 Respostas para “O jornalista precisa de uma boa formação humanista, saber ver o mundo, afirma Lúcio Flávio Pinto

  1. Marly Silva

    casa dos avós maternos

  2. Marly Silva

    Para o sociólogo polonês radicado na Inglaterra, Zygmunt Bauman, a literatura é tudo, a literatura basta, inclusive como base para a ciência social. Não concordo inteiramente, as sociedades ágrafas e as culturas de tradição oral em geral, ontem e hoje, não têm literatura no sentido aqui referido e, no entanto, como há humanismo entre elas! forjado na base da comunhão e reciprocidade que orienta a sociabilidade e a formação de seus membros. Se algum humanismo carrego comigo, que vivi até a pré-adolescência no interior do Pará, ele não veio da literatura mas sim de um certo modo de vida familiar e comunal na grande casa de meus avós. Meu avô foi “dublê” de pescador, funcionário público e músico, exatamente nessa ordem em sua jornada. O mais importante na sua vida foi a música, sem dúvida, que ele também ensinava na sala de nossa casa a quem quisesse aprender. E repartíamos o pão e o vinho e também os solos jazzísticos de clarinete e trompete com vizinhos menos afortunados e os compadres e comadres que vinham ao nosso encontro e traziam víveres e frutas de seus sítios próximos à pequena cidade. E retribuíamos indo até eles nas datas comemorativas de santos ou não. Foi essa sociabilidade fundada no amor e na dádiva que me levou à escolha da primeira formação profissional: serviço social, que eu acreditava a mais humanista das profissões, porque centrada no outro, na ajuda ao próximo na base da conversa. Esta escolha foi atropelada pelo meu engajamento na luta contra a ditadura, onde descobri o assistencialismo manipulador dos governos militares que derrubaram em mim a crença na profissão, levando-me a uma outra escolha: a sociologia, que me levou à ensaística de Bauman (que não aprecio muito mas é necessária em certas circunstâncias) e outras sociologias que o antecederam, que só comprovavam a lição de casa: que sem comunhão não há humanismo possível. Mas para isso é preciso que exista uma casa… No caso da formação de jornalista, talvez, deslocando a sede-redação do centro para as associações de moradores na periferia, contribuísse a desmanchar desvios de ação! A tecnologia móvel de hoje permite perfeitamente essa inversão. Quando fiz estágio voluntário na comunidade de base do Jurunas, COBAJUR, aprendi a fazer atas de reunião e descrição de fatos e controvérsias que ali aconteciam, isso nos anos 80. Muito melhor do que altas doses de teoria da comunicação e manuais importados que, pelo andar da carruagem parece que não estão dando muito certo. Estou de acordo com essa critica e também com a idéia propositiva de kibutz cientifico (e jornalístico , cultural, arquitetônico etc…) que poderia ser patenteada por você, Lúcio, que a expôs no Auditório Benedito Nunes, por ocasião do II Congresso anual do IBE “Avançando na inclusão”, em março deste ano. Algo similar conheci em experiências na arquitetura em SP, não exatamente como você pensa mas com o mesmo espírito público de ação coletiva. Nada, nada, uma disputa saudável em torno do “pai da criança” já daria uma boa divulgada na idéia que é excelente, o que não é pouco para uma cidade onde impera não só a lei do silêncio imposto mas também a lei da fofoca que alimenta a primeira num eterno círculo do atraso democrático.
    Como diz Fernando Pessoa tudo vale a pena se a alma não é pequena !!!
    PS. À propósito de mídia e jornalismo. A melhor resposta de um sociólogo à questão do segredo e monopólio da informação está no livro a Miséria do Mundo, onde Bourdieu disponibiliza entrevistas de sua equipe de trabalho, na íntegra, permitindo que todo e qualquer leitor possa fazer suas próprias interpretações , que podem coincidir ou não com as dele e de sua equipe . Também não concordo com a critica feita por Dominique Wolton à critica de Bourdieu às mídias, especialmente à televisão (cf.Sciences Humanines, “l’oeuvre de P.Bourdieu”, 2012, disponível online) e que foi assimilada acriticamente no Brasil onde a realidade é totalmente outra. Enfim, todos os aplausos para Wolton e seu entourage, o que em outras palavras significa : esqueçam que Bourdieu existiu um dia. Incômodo demais para o nosso jornalismo publicitário midiático, muito bem sucedido na “pós-modernidade” da internacional neoliberal “local-global”. Ufa! Insuportável para ele tanta poluição…

Manifeste solidariedade